O ápice da crise
Era uma quarta-feira, 9 de Outubro de 2024. Acordei e não senti vontade nenhuma de sair da cama. Passei mais de uma hora sem conseguir juntar forças para me levantar, mas chegou a hora da primeira reunião do dia e não teve mais jeito. Fui direto para o computador sem nem tomar água e tentei passar despercebido. Diferente dos "dias normais", fiquei quieto e com o microfone e a câmera fechados. Quando precisei falar, fui tão direto que até o "Bom dia" evitei. Imediatamente recebo algumas mensagens privadas: "Dá pra ver que você não tá legal.", "O que você tem?", "Tá tudo bem?". Uau, também não sei.
Tentei seguir o dia trabalhando normalmente, mas a cada minuto que passava olhando para a tela, respondendo mensagens e fazendo minhas tarefas, mais agoniado ficava. "Preciso trabalhar. Se eu não fizer, quem vai fazer. Não quero falhar. É frescura.". Este era o som que ecoava na minha cabeça enquanto minha garganta doía com a vontade de chorar quase incontrolável. Bom, não era frescura.
Comecei a sentir uma pressão no peito que ficava cada vez mais forte. Mesmo hipertenso, evitei pensar que pudesse estar infartando. "Preciso aguentar. Deve ser gases.".
Segui obsecado por fazer algo que nem me lembro mais o que era. Não aguentei mais. Levantei e fui na direção do quarto onde minha esposa estava. Não consegui chegar. Caí no chão, tentei gritar por ajuda, mas a voz não saiu. Chorando e desesperado, bati o mais forte que pude na parede afim de fazer a Priscila vir me ajudar. Ela me ouviu. Correu para entender o que estava acontecendo, mas eu, além de também não saber, não tinha voz. Naquele momento, só soube chorar e foi isso que fiz por alguns minutos.
Quando consegui me levantar, tomei um banho e me deitei sentindo as dores da tensão muscular em várias partes do corpo. Minha nuca latejava e lembrei que precisava aferir a pressão: 19 por 12. Foi meu recorde aos 33 anos.
Post-mortem
Os dias seguintes foram de agonia e muitas lágrimas. Trabalhando com as notificações desligadas em todos os apps de mensageria, redes sociais, alarmes e etc. Qualquer contato com o celular, calendário ou o combo slack/teams me davam calafrio pior do que qualquer outra coisa que eu já havia experimentado.
"Sei que tá difícil, mas vamos ali numa war room." Pois é, a vida continuava normal lá fora. Não podia priorizar mais a empresa do que minha saúde. No avião sempre somos instruídos a, primeiro, colocar a máscara em nós mesmo para depois ajudar os outros. Demorei alguns dias para assimilar o golpe e colocar essa teoria na prática.
Conversei com alguns amigos e isso foi fundamental pra entender diversas coisas, inclusive que eu precisava de tratamento psicológico e psiquiátrico.
Assim o fiz. Na primeira consulta, o diagnóstico que eu já suspeitava: Burnout com sintomas depressivos agudos. Ai ai ai... A fala seguinte do psiquiatra me assustou um pouco: "Não é comum dar o diagnóstico em uma consulta, mas o teu caso já está em um grau muito elevado e não tem porquê postergar".
Iniciei os tratamentos, fui afastado do trabalho e voltei a fazer tudo que me fazia bem e eu havia abandonado nos últimos 8 meses para conseguir entregar o que a empresa esperava de mim. Retomei as atividades com a família, resolvi pequenos problemas em casa, voltei aos treinos na academia e natação, viagei, caminhei no parque, e tudo mais que tinha direito. Foi o que me fez voltar a vida.
As consequências
Hoje, 4 meses depois, ainda sofro as consequências tanto físicas quanto psicológicas de toda essa crise. Meu peso, as crises de ansiedade e a pressão arterial aumentaram, a testosterona (que é essencial para um homem) e a "bateria social" diminuíram.
Se não fosse a terapia, com certeza estaria pior. Muita coisa não fazia mais sentido. Questionei a mim mesmo se era um bom pai, marido, filho e/ou irmão e, ainda mais, profissionalmente. A sensação que eu tinha era que eu estava enganando as pessoas a minha volta, principalmente no trabalho. A ausência de pessoas que sabiam lidar com isso no momento certo, antes da crise acontecer, foi sentida da pior maneira possível.
Graças a Deus, notei isso a tempo de agravar ainda mais a depressão. Procurei os médicos especialistas em saúde psicológica e iniciei o check-up que me prometi que faria até o final de 2024.
O tratamento
O psiquiatra, Dr. João, e a psicóloga, Dra. Andrea Hipolito, estão sendo fundamentais na recuperação. Já me ajudaram a entender que preciso do trabalho para viver e não viver para trabalhar, é melhor construir valor para a família do que para a empresa, eu sou bom no que faço, meus valores estão sólidos na minha personalidade e ter certeza disso vai me fazer ter sucesso em tudo que eu me propor a fazer (e isso nem sempre está ligado a dinheiro).
Eles entenderam meu estilo de vida, o quanto a atividade física, a família e a vida religiosa são importantes para mim, como eu gosto de ser na vida pessoal e no trabalho e propuseram um tratamento adequado para o meu caso. Me dedico ao máximo em todas as atividades propostas por ambos afim de acelerar a recuperação.
A causa
Não vou me estender muito aqui. Só deixo alguns alertas:
- VALORIZE-SE. Não vale a pena ganhar alguns reais a qualquer custo;
- Saiba dizer não. "Tudo lhe é permitido, mas nem tudo lhe convém";
- Seja sincero ao dar feedbacks: Vejo pessoas próximas passando pela mesma situação e advinhe a coincidência entre todas: O medo de perder o emprego e a certeza de que falar a verdade não muda nada. Bom, não falar nada diminui ainda mais a probabilidade de mudança.
Apesar de tudo, estou com a consciência tranquila. "A causa" está muito mais relacionada a algo que eu não podia controlar do que a algo que eu poderia ter feito.
Conclusão
Encontrar o equilíbrio é sempre um desafio. Em qualquer área da minha vida, equilibrar o poder com o dever é muito difícil. Dieta, treino, família, trabalho, finanças, estudos, lazer...é fácil encontrar prazer em qualquer uma delas, mas basta que uma comece a prejudicar a outra para o barco afundar.
Encerro agradecendo a Deus por uma segunda oportunidade de viver, a minha família por ter estado comigo nessa fase difícil, aos amigos que se preocuparam, me ouviram e me apoiaram e a você que leu até aqui.
De coração, muito obrigado e espero que você fique bem.
Comentários liberados